sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

Em Memória do Prof. Benjamim Pinto Bull

obituárioBenjamim Pinto BullACadémico e político guineense O amigo de Senghor que a Guiné não aproveitou Lutou pela independência progressiva da Guiné e foi 'acolhido' pelo Senegal francisco almeida leite*Arquivo DN Era daqueles homens como já há poucos um lutador. Benjamim Pinto Bull, que morreu ontem aos 89 anos no Hospital Amadora-Sintra, vítima de uma doença prolongada, foi um defensor intransigente de uma independência progressiva da Guiné-Bissau, que chegou aliás a tentar negociar nos bastidores do poder de Salazar. Benjamim liderou a União dos Naturais da Guiné-Portuguesa, um movimento que defendia uma "evolução muito negociada" para aquele país, conta ao DN Adriano Moreira - professor catedrático, ministro do Ultramar de Salazar e antigo presidente do CDS.
Oriundo de uma das famílias mais ilustres da Guiné portuguesa - o seu irmão, Pinto Bull, foi o histórico deputado da Ala Liberal, que morreu em 1970 no acidente de helicóptero com José Pedro Pinto Leite -, Benjamim foi enviado aos sete anos para França, onde ingressaria num seminário. Aí concluiu o ensino secundário, tendo depois ido para Viana do Castelo, onde estudou grego e latim num outro seminário. Abandonado o percurso que o iria conduzir a uma vida eclesiástica, Benjamim Pinto Bull regressou, já homem, à Guiné-Bissau para trabalhar nas alfândegas.
A PIDE entra, então, no seu encalce e o exílio no Senegal foi a solução óbvia para quem não queria (e não podia) deixar de ter um papel activo num caminho que só podia conduzir a uma autodeterminação política dos guineenses. Léopold Sédar Senghor, o presidente/escritor, acolhe-o e não mais o larga. Adriano Moreira lembra a ligação "quase sentimental" de Pinto Bull a Senghor, e deste a Portugal "o Senghor até dizia que tinha uma gota de sangue português". No Senegal, Benjamim promove a língua portuguesa, quer ao nível do secundário, quer ao nível do ensino superior, e daí a até se tornar o tradutor oficial de Senghor foi apenas um passo.
Forma-se em filologia românica em Paris e regressa a Dacar para dar aulas. Como não podia deixar de ser, a sua tese de doutoramento versa sobre o trabalho do seu grande 'protector' - "Leopold Sédar Senghor e a Negritude" -, tendo também publicado "Filosofia e sabedoria, O crioulo da Guiné-Bissau" (de 1989). Praticamente no prelo estava a sua autobiografia, "Memórias de um Luso-Guineense", com introdução de Adriano Moreira "julgo que o livro até já estava impresso. Ele pediu-me uma contribuição, que não podia negar, e agora só espero que o livro veja a luz do dia".
Em Portugal desde 1984, onde chegou a ser consul do Senegal em Lisboa, Benjamim leccionou as disciplinas de Latim Jurídico e Literatura Africana de Expansão Portuguesa em várias universidades privadas, como a Moderna, a Internacional ou a Lusófona. Em 1992 não se livrou de um triste episódio com um soldado da GNR, que acabou acusado de racismo e violência contra o professor guineense. Benjamim tomou a defesa de um rapaz de apenas 12 anos num autocarro que tomou a caminho de Loures. O rapaz estaria a ser insultado, o professor acabou agredido. O caso "explodiu" nos jornais e fez até com que Mário Soares, então Presidente da República, lhe apresentasse "desculpas, por Portugal".
Hélder Vaz, líder da Coligação Plataforma Unida que se apresentou como candidato a primeiro-ministro nas últimas legislativas na Guiné, lamenta a perda ao DN "A morte esquecida deixa o mal e leva o bem. O professor Pinto Bull poderia ter sido muito útil à Guiné, como promotor do diálogo e da construção. O país, desnorteado, não o aproveitou, como não aproveita muita gente".* Com Lusa

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